Te queria de volta dos quartos obscuros que você se trancou com minhas chaves.
Deixei as lamparinas de meu eu em cada porta, cheias de óleo de minhas apêndices.
Ao que tudo indica, não são tão bons pra manter fogo acesso.
Devia ter deixado óleos de meus rins.
Assim quando saísse, teria por onde acreditar nas minhas veias.
Escolheria um caminho que lhe fosse ameno e aprazível até o sofá.
Eu te faria um chá.
Escolheria a dedo bolachas inteiras pra que não soasse despeito.
Manteiga ou geléia?
Talvez você não pulasse a janela pra sair pela minha orelha esquerda.
Wednesday, April 29, 2009
Friday, April 17, 2009
Erva daninha.
Cutucava bem acima do mamilo. Era uma coceira recorrente e ácida. Inflamou em poucos dias; uma bola de pus (como uma grande espinha) com um ponto preto no meio. Na frente do espelho, tirou a camiseta e passou gelo no local. Expremeu firme, até que o pus jorra-se no espelho. Do ponto preto saiu um frio fio grosso de arame.
Envolveu a camiseta na mão e puxou lentamente; não por falta de força, mas cada centímetro fora e as farpas do arame dilaceravam um pouco mais sua carne. Vencido, amarrou o fio nas grades na janela e deixou o corpo cair.
Depois de tempo pendurado pelo peito, enfim a carne se rasgou. Na face, não sobrou traço inteiro; pouco sobraria do corpo quando tirado algo enraizado com tamanha profundidade e afinco.
Arrastou-se em meio ao sangue no chão do quintal do sobrado e olhou para o que paradoxalmente lhe sustentava e causava dor. Pendurada na janela, a silhueta da menina em arame farpado ainda sorria.
Friday, April 10, 2009
Roteiro do não dito.
O chá de boldo amargava as xícaras quando Ana resolveu abrir as janelas. O pouco de sol não resolveu enquanto houveram nuvens, densas e frias.
Aos cães, sobravam as sinfonias da lua cheia. A noite forasteira e repentina mal deixou a polenta e o arroz ficarem prontos. Das velas e pequenas lâmpadas (dos abajures dos cantos da sala), luzes coloriam as retinas. Corujas piavam quando Roberto chegou.
[...]
Cauterizados pelo gosto do vinho, alguém discordou da salada de rúcula enquanto o fogo já consumia as cadeiras, mesas e a prateleira das louças.
- As cebolas são o problema. Ou talvez os alhos e o limão, não sei ao certo.
- Talvez seja melhor fazer peixe.
- Com fome ainda?
- Sinto muita fome pela manhã.
[...]
De tolhas sentados na cama, fumando cigarros fedidos e cheirando vinho, surgiu a discórdia quanto ao tempo dos lados dos vinis.
- Cansei de Billie Holiday. Um lado de Guizado?
- Um lado do seu melhor vinho garçom.
- A senhorita dança muito bem para uma polaca.
- São estímulos mútuos, senhorito.
[...]
- Não tocou na quínua e nos pães, nem no leite.
- Enchi as garrafas e peguei os bilhetes. Tomemos um sorvete?
- De framboesa e limão?
- De laranja com fotografias.
[...]
Pensou pra si:
- O que fazer com as corujas?
- Quer café?
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