Wednesday, January 31, 2007

De grão em grão.


Inclinou o azeite suficiente para que se formasse um fino fio dourado e passeou com ele sobre os recém cozidos grãos-de-bico espanhóis. Ainda colocaria sal e vinagre, mas no momento dividia as atenções entre cortar em pequeninos cubos as cebolas e a água que fervia as gordas salsichas alemãs, que fatiaria em rodelas como fez às cebolinhas.

Vestiu a mesa de toalha xadrez vermelha e verde, dispôs a travessa das salsichas ao lado à dos grãos, na frente da jarra de água e atrás do pote de molho de mostarda preta. Pintou seu prato meticulosamente pra que ficasse bem colorido, e o observou durante longos segundos antes de comê-lo, intercalando as garfadas com goles d'água.

Repetiria o ritual todo dia ao entardecer, desde que completara 23 anos. As segundas, quem fazia as vezes da salsicha eram grossos bifes, e as terças costelas assadas. As quartas amassava os grãos com hortelã e os comia com pão, nas quintas, mesmo as de muito calor, cozinhava um grosso caldo de grãos-de-bico com bacon, e nas sextas servia-os acompanhados de bacalhau. Sábado apreciava os grãos com gengibre, e junto do cozido ainda iriam alguns alhos e molho shoyo.

Comia sempre sozinho. Morreu antes de completar o vigésimo quarto ano de vida.

3 comments:

Anonymous said...

prometo reler amanha, bem acordada!

Anonymous said...

ocasionalmente, envenenava o azeite com cianureto, num ritual masoquista sincero.

geo. said...

de grão em grão ele encheu o papo?

vejo o seu espírito cozinheiro aguçado.

beijo